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A filha da loja de mochi: Tamako Market e Tamako Love Story (resenha)

Tamako Market (série)


    Um distrito comercial. Um pássaro muito convencido. Garotinhas fofinhas. Muito, mas muito mochi. Você consegue imaginar um anime que sintetize tudo isso? Pois bem, esse anime é Tamako Market. 

    A história gira em torno de Tamako, uma colegial que ama mochi — um bolinho feito de arroz glutinoso — e reside no distrito comercial de Usagiyama onde sua família tem uma loja de mochi, a Tamaya.  A garota vive sua vida se dividindo entre suas atividades escolares junto com suas amigas do clube de bastão, Kanna e Midori, e o trabalho na loja de mochi de sua família.

      Tamako Market é um anime muito levinho e divertido. Num primeiro olhar ele não tem nada de mais e talvez, analisando bem, a obra não tem nada de mais mesmo. São apenas garotinhas fofinhas sendo fofinhas, várias piadinhas e mochi para tudo que é lado. Entretanto, apesar da simplicidade do enredo de Tamako Market, é muito gostoso acompanhar o anime. A série, do ano de 2013, é composta de 12 episódios bem engraçadinhos e tem um elenco incrível. Metade, ou talvez todo o carisma de Tamako Market reside em seus personagens.

    Começando pela protagonista, Kitashirakawa Tamako, a filha da loja de mochi. Ela é uma garota meio lerdinha e, em alguns momentos, até mesmo desastrada. Tamako é completamente apaixonada por mochi; ela ama mochi e tudo que tem relação com essa iguaria da culinária japonesa. A garota também se dedica bastante, tanto na loja de sua família, quanto no clube de bastão do qual faz parte juntamente com Midori e Kanna.

      Tokiwa Midori é uma colega de classe e também uma amiga de infância de Tamako. Midori é muito bonita e por isso é popular em seu colégio tanto com os meninos, quanto com as meninas; o avô dela tem uma loja de brinquedos no mesmo distrito comercial em que se encontra a loja de mochi da família de Tamako.  

    Makino Kanna, por sua vez, é filha de um carpinteiro. A garota tem aptidão para a carpintaria e sempre que vê algo quebrado sente uma vontade gigantesca de consertar o objeto em questão. Ela diz se negar a segurar algo que seja mais leve que um martelo e gosta de ângulos retos. Por conta de tudo isso, Kanna é uma das personagens mais engraçadas de todo o elenco. Ela também tem um lado meio perverso e adora provocar o pássaro Dera.

Mochimazzi Dera é um pássaro de uma ilha distante que está em uma jornada para encontrar uma noiva para o príncipe ao qual serve. Entretanto, ele acaba indo parar no distrito comercial e sendo “adotado” pela família de Tamako. Ele é um pássaro muito convencido e seus comentários são, por muitas vezes, inconvenientes. De tanto comer mochi Dera engorda terrivelmente, ficando até mesmo com dificuldades para voar. No meio disso tudo ele acaba conhecendo uma garota chamada Shiori e se apaixonando por ela. As tentativas de Dera de conquistar ou se exibir para Shiori apenas aumentam as doses de humor do anime.


      Asagiri Shiori é membro do clube de badminton. Ela é muito tímida, tem um ar frio e não tem muita facilidade em se aproximar das pessoas. Ainda assim, ela consegue ficar amiga de Tamako. Graças a isso ela acaba frequentando bastante a loja de mochi e tendo de lidar com os constantes galanteios de Dera. Porém, as coisas melhoram um pouco para ela nesse campo com a chegada de Choi. 

Mochimazzi Choi é uma profetisa da mesma ilha de onde veio Dera. Assim como o pássaro, ela serve ao príncipe da família Mochimazzi. Choi é extremamente fiel ao seu príncipe, Mochimazzi Meccha, e é a única capaz de colocar Dera na linha. 



    Com relação aos personagens que compõe o distrito comercial, há uma infinidade deles. Cada um com sua peculiaridade, todos bastante carismáticos e engraçados. Entretanto, é necessário destacar dois deles em especial.

      Kitarashikawa Anko é o primeiro personagem do distrito a merecer um destaque especial. Ela é a irmã caçula de Tamako e ainda está no ensino fundamental. Diferente de Tamako, Anko não gosta tanto assim de mochi. Ela também possui uma personalidade mais rebelde e é bem menos desligada que a irmã. 

 
Outro personagem do distrito que merece ser mencionado é Oji Mochizou. Assim como Tamako ele também é filho de uma loja de mochi. Na verdade, a loja de mochi da família de Mochizou se localiza, exatamente, em frente à loja de mochi da família de Tamako. Por serem ambos filhos de lojas de mochi e morarem de frente um para o outro, ele e Tamako são amigos de infância. 
 
    A série de Tamako Market é muito divertida e levinha. O carisma do elenco é o suficiente para cativar o expectador, que assiste os doze episódios sem nem mesmo ver o tempo passar. É muito fofinho e bastante engraçado, com uma trilha sonora que combina bastante com a temática do anime e cola na sua cabeça.  Entretanto, se a série de anime já é uma graça, o filme consegue ser ainda melhor.

Tamako Love Story (filme)


      Intitulado Tamako Love Story, o filme se passa algum tempo depois dos acontecimentos que colocam fim à série de anime. Como o título sugere, o filme é uma história de amor focado no romance entre os personagens, pouco explorado na série de TV.  

    Em Tamako Love Story, Tamako e seus amigos estão no último ano do ensino médio e, portanto, devem decidir quais caminhos seguir a partir de agora. Mochizou, o amigo de infância de Tamako, resolve ir à uma universidade em Tóquio. Entretanto, antes de partir, ele decide confessar seus sentimentos à garota. Tamako tem, então, de aprender a lidar com a confissão e entender quais são os seus próprios sentimentos por Mochizou.

Se o anime já era fofo, o filme é fofo ao quadrado. Tamako Love Story é, simplesmente, uma das histórias de amor mais bonitinhas que você vai assistir na vida. Os sentimentos do Mochizou, a importante decisão de, enfim, se declarar, a forma como ele trata tudo isso.... É tão bonitinho! Mais do que isso, causa identificação. Os dilemas dele convencem, o expectador acaba torcendo muito para que tudo dê certo para o garoto.

    Do lado da Tamako as coisas não são diferentes. A forma como ela reage à confissão, a busca dela por entender os próprios sentimentos... tudo também é muito bonitinho. E engraçado, muito engraçado! Além de tudo, também é perfeitamente compreensível, afinal, o Mochizou é o amigo de infância dela, ele sempre esteve lá. Toda essa questão causa uma expectativa gigantesca; você fica lá, assistindo e torcendo, esperando para ver a decisão de Tamako e qual rumo a história irá tomar.
   
    Para além do romance, temos a presença dos demais personagens que ajudam a tornar tudo ainda mais engraçado. A Kanna, então, se supera, sendo dona de algumas das melhores frases do filme todo.  

    O filme é ainda melhor que o anime. Extremamente divertido, fofo, bonitinho e até mesmo um pouquinho dramático. É quase uma hora e meia de uma história bem levinha, bem gostosa de acompanhar. O visual é muito bonito, há algumas cenas com umas cores fantásticas, e a trilha sonora é muito boa também. Vale a pena assistir, o filme ao menos vale.

    Tamako Market e Tamako Love Story são algumas daquelas histórias bem bobinhas, mas também bem balsâmicas, que em alguns momentos chega até mesmo a bater lá no fundo do coração. São um bom exemplo de que há momentos em que o moe erra, mas quando ele acerta, acerta em cheio.



Resenha: Declínio de um homem

“Chegava a pensar que sobre mim havia recaído um fardo de dez desgraças e que, se apenas uma delas fosse repassada ao meu vizinho, seria suficiente para mata-lo. ”

     A depressão pode parecer, e talvez seja, o mal do século atual; entretanto, o que pode ser caracterizado como “depressão” não é um fenômeno que apareceu magicamente com o surgimento do século XXI, ela já existe faz muito tempo. “Declínio de um homem”, de Osamu Dazai, é um livro onde o que hoje chamamos “depressão” se faz presente. O protagonista e narrador Yozo conta sua vida em forma de diário. Ao invés de ser dividido em capítulos, o livro é dividido em três cadernos. A obra sintetiza em passagens e cenas, por muitas vezes biográficas, as angústias do próprio Dazai, autor que se suicidou aos 38 anos de idade. 

   A narrativa do livro é notoriamente direta. Escrito em primeira pessoa, o narrador diz muito com poucas palavras. Yozo é um jovem estudante provinciano que tenta sobreviver em Tóquio e conta suas dificuldades para conviver com as demais pessoas e se encaixar, não só em Tóquio como em qualquer lugar. Logo no início do livro, Yozo conta sobre sua infância um tanto traumática e sobre como ele sempre se sentiu deslocado. O personagem é envolto em uma tristeza que se alastra por todo o seu ser impedindo-o de encontrar uma alegria de viver que, na realidade, ele nunca sentiu.

   Ainda no primeiro caderno, antes que a narrativa se torne um pouco mais definida e linear, Yozo afirma algo muito interessante: apesar de ser uma pessoa que nunca está feliz e que sente como se tenham sido despejadas sobre ele várias desgraças, Yozo admite ser incapaz de compreender a natureza ou a intensidade do sofrimento alheio, ainda que esse sofrimento seja algo como passar fome.

   Outro traço da personalidade do personagem é a maneira como ele se apresenta para os outros. Para disfarçar seus medos, insegurança e seus pavores internos, Yozo veste a capa de piadista. Ele se ocupa de fazer palhaçadas, dos mais variados tipos, para causar risos aos outros, mas caso alguém perceba que tudo é proposital, a situação acaba por traumatizar ainda mais o personagem. Yozo diz ter medo das outras pessoas e, mesmo despertando o interesse de várias mulheres, admite não ser capaz de amá-las; sobrevive fazendo histórias e ilustrações de qualidade duvidosa.

   “Declínio de um homem” é um livro de extensão curta, entretanto em seu reduzido número de páginas sobram emoções e pensamentos. A mente atormentada de Yozo, seu vício na bebida, suas várias recaídas.... Tudo é entregue ao leitor que se vê incapaz de não pensar sobre o conteúdo da obra. A leitura é rápida e o que acontece com Yozo é ambientado no século passado, mas poderia estar acontecendo hoje.

    O final do livro é a parte de maior apelo emocional da obra, não no sentido de que a cena se projete como um drama, mas no sentido de conseguir tocar, de fato, o leitor. Se você chegou, milagrosamente, até ali sem pensar, refletir ou se abater com nenhum dos acontecimentos, nas páginas finais você será tocado.

    Além da linguagem direta, sem muitos floreios exagerados, a narrativa é capaz de envolver completamente o leitor seja através do próprio protagonista, seja através dos demais personagens com quem Yozo se encontra ao longo de sua vida. Pode-se dizer que é um livro “carismático”, por falta de palavra melhor. “Declínio de um homem” é um daqueles livros que você lê em um único fim de tarde e que te proporciona passagens nas quais você vai pensar por dias a fio.

“O Yo-chan que conhecíamos era uma pessoa muito sincera, prestativa, se ao menos não bebesse... aliás, mesmo quando bebia... o menino era um anjo. ”

Resenha: Eu Sou Um Gato

“Uma das coisas mais importantes na vida tanto dos humanos como dos animais é o autoconhecimento. ”

       Eu Sou Um Gato (Wagahai wa neko de aru no original em japonês) é o livro de estreia de Natsume Souseki e tem como característica fundamental um elemento um tanto quanto curioso, ou até mesmo inusitado: o romance em questão é narrado por um gato.

    Ao aparecer num terro baldio, o gato, narrador da história, após passar por algumas adversidades acaba por ser acolhido na casa de Chinno Kushami, um professor mal-humorado e estagnado em sua completa falta de perspectiva.  Ao narrar acontecimentos referentes à vida de seu dono e demais situações que observa, o gato ridiculariza a vida da intelectualidade japonesa da Era Meiji ao demonstrar a fragilidade do professor e daqueles que o cercam. Apresentando-se como um ser de uma raça superior, o narrador não poupa nada nem ninguém; sua linguagem é carregada de sarcasmo quando o assunto é o ser humano, e mesmo quando demonstra um toque de ternura esta não deixa e possuir um traço de deboche.

    A leitura de Eu Sou Um Gato é uma experiência, inegavelmente, interessante; talvez não seja assim tão prazerosa no começo, mas não é todos os dias que nos deparamos com um livro narrado a partir da perspectiva de um gato. Inicialmente pode ser que o livro soe um pouco parado, é um gato analisando seu dono e àqueles que o cercam, não uma grande trama cheia de reviravoltas; entretanto, após ler alguns capítulos e compreender melhor a proposta a leitura flui de forma mais ágil e agradável.

    A característica mais marcante da narração, levando em consideração a forma de narrar, é a ironia. Enquanto conta os fatos que observou, o gato debocha e ironiza o tempo todo as atitudes de seu dono e de seu ciclo de amizade. Todos os personagens, ações opiniões passam pelo crivo do felino que os critica e analisa sem dar a ninguém uma colher-de-chá. É também o olhar irônico responsável pelos momentos cômicos da narrativa.

    O livro todo é, ainda, recheado de referências filosóficas e artísticas tanto ocidentais quanto orientais. Olhando por essa perspectiva, é possível perceber que o gato é muito mais erudito do que os eruditos que observa, uma vez que os últimos são por vezes ingênuos, ignorantes e possuidores de pensamentos errôneos.

    Eu Sou Um Gato convida o leitor a ser cúmplice do narrador em desvendar o cinismo interior dos personagens, refletindo sobre a condição contraditória do ser humano em seus atos diários. Uma análise psicológica do ser humano feita através do olhar de um felino dotado de muita perspicácia, inteligência e deboche.

“Os humanos têm quatro patas, mas se dão ao luxo de utilizar apenas duas. Poderiam andar mais depressa se usassem todas, mas se contentam apenar com um par, deixando as restantes estupidamente penduradas como bacalhaus postos a secar. ”



Resenha: Fune wo Amu

      Alguma vez você já parou para pensar como é feita a edição de um dicionário? O quão trabalhoso e caro deve ser o processo de compilação e definição de uma grande quantidade de palavras? Bom, talvez você nunca tenha pensado ou dado importância para essa questão, mas houveram pessoas que sim e graças a isso nasceu Fune wo Amu.  

     O anime tem, como principal ponto da história, a edição de um dicionário denominado “A Grande Passagem”. Majime Mitsuya, originalmente membro do departamento de vendas da editora Genbo Shobu, é recrutado para o departamento de dicionários por Araki Kouhei, um editor que irá se aposentar em breve. O departamento de dicionários é conhecido internamente na editora como “inseto comedor de dinheiro”, mas apesar disso, Majime usa sua perseverança e apego às palavras para se tornar um grande editor. A série é baseada na novel de mesmo nome escrita por Shion Miura.

     Fune wo Amu é um slice of life com um clima um pouco diferente, possuí um tom que deixa o expectador imerso em sua narrativa. Por causa dessa imersão, a série parece ter um caráter mais sério do que os animes habituais, e talvez tenha mesmo.

     Retratar o processo de edição de um dicionário pode parecer uma ideia um tanto quanto peculiar, porém é algo que funciona muito bem. A partir do processo de edição e de tudo o que um dicionário significa, é que se cria a relação dos personagens uns com os outros e, até mesmo, com o mundo.

     O maior exemplo disso é o próprio protagonista. Majime Mitsuya é um homem muito tímido, sem muitas habilidades sociais; ele tem um ar modesto e contido e gosta muito de livros. Majime é o tipo de pessoa que pensa muito antes de dar uma definição de uma palavra e isso é muito bonito. Ele interpreta o mundo de uma forma diferente, sabe uma enormidade quantidade de palavras embora nem sempre saiba muito bem como utilizá-las, e tem um lado introspectivo muito carismático.

     A personalidade de Majime acaba por opor-se quase completamente à de Nishioka Misashi, que poderia ser definido como um extrovertido de marca maior. Ele é o primeiro membro do departamento de dicionários a se encontrar com Majime e, apesar de diferentes, os dois trabalham muito bem juntos, se completando. 

     Outra personagem a ter uma relação de proximidade com Mitsuya é Hayashi Kaguya, uma moça porque ele se apaixona quase que à primeira vista e cujo sonho é se tornar uma grande chef de cozinha.

    Os demais personagens do departamento de dicionários (Araki Kouhei, Sasaki Kaoru, Matsumoto Tomosuke) ajudam a compor o ar de “seriedade” da obra e auxiliam Majime na tarefa de completar o dicionário. 

     
     Além do carisma do protagonista e da temática um tanto quanto diferente, Fune wo Amu tem ainda como característica uma enorme beleza. O anime é muito bonito, a começar pela abertura e pelo encerramento que combinam perfeitamente com o clima da obra tanto no sentido visual, quanto no quesito sonoro.

    A relação que Majime tem com as palavras e a forma como ele interpreta o mundo é algo muito bonito de se ver e é um tanto engraçado também. É como se ele fosse meio deslocado, de alguma forma, e ao mesmo tempo isso só o torna ainda mais perfeito para o trabalho de editar um dicionário.

     Acompanhar Fune wo Amu é uma experiência quase enriquecedora, a animação te deixa meio extasiado, como se você afundasse em um mar de palavras enquanto assiste o episódio e depois fosse puxado de lá de dentro. Uma obra com uma temática e um protagonista cheios de carisma que se faz você pensar sobre o quão importante são as palavras e tudo o mais que se relacionam a elas.