“Os
livros devem ser pesados, pois carregam dentro de si o peso de todas as coisas do mundo”
Quantas vezes um leitor ao ler um
livro não se imagina dentro da própria história? Quantas vezes ao se perder nas
páginas de um livro você, leitor, não desejou estar dentro daquele universo? O
quão maravilhoso não seria se pudéssemos cruzar a fronteira existente entre
realidade e fantasia? Não seria fantástico poder viver sua história favorita e
ver-se cara a cara com seus personagens? No universo da trilogia Mundo de Tinta
todas essas coisas são possíveis, mas, afinal, seria isso uma benção ou uma
maldição?
A trilogia Mundo de Tinta é composta
pelos livros Coração de Tinta, Sangue de Tinta e Morte de Tinta. A série é de
autoria de Cornelia Funke, mesma autora de O Senhor dos Ladrões, e foi
publicada no Brasil pela editora Seguinte.
No primeiro livro, Coração de Tinta,
o universo que Cornelia criou nos é apresentado pela primeira vez. É onde
conhecemos Mortimer Folchart, um encadernador, e sua filha, Meggie. Mortimer é,
aparentemente, um homem totalmente comum. Ele ama os livros quase tanto quanto
ama sua filha e dedica seus dias a encaderná-los e restaurá-los. Porém, com o
aparecimento de um misterioso cuspidor de fogo, chamado Dedo Empoeirado,
descobrimos que Mortimer não é tão comum assim. O encadernador tem um talento
curioso: quando ele lê um livro em voz alta é capaz de trazer seres e
personagens de dentro do livro para o mundo real, ou ainda, enviar pessoas do
mundo real para dentro das páginas do livro; por conta disso, todos o chamam de
Língua Encantada. Há muitos anos atrás,
enquanto lia o livro Coração de Tinta,
Mortimer trouxe Dedo Empoeirado para o nosso mundo e, em troca, Theresa, sua
esposa, foi parar dentro do livro. Mô tenta trazer Theresa de volta a todo
custo, mas não obtém sucesso algum; porém, Dedo Empoeirado não fora o único que
saíra das páginas de Coração de Tinta,
não, o vilão, Capricórnio também viera. Desta forma, Mô desiste de ler sua
esposa de volta e cria sua filha sozinho. E agora, anos depois, Dedo Empoeirado
reaparece exigindo que Mô o leia de volta. As engrenagens da história giram — e
em meio ao aparecimento de Elinor, tia da esposa de Mortimer e Fenoglio, autor
de Coração de Tinta — Mô e Meggie,
possuidora do mesmo talento de seu pai, se veem prisioneiros de Capricórnio sem saber
se terão um final feliz.
Coração de Tinta é, logo à primeira
vista, um livro muito bonito. Ele nos transporta para um novo universo, abre um
mundo de possibilidades e nos coloca novamente em contato com uma narrativa de
Cornelia. A autora escreve com muita leveza e beleza, as palavras se encaixam muito
bem, é uma leitura muito gostosa. Por ser o primeiro livro, Coração de Tinta é
o grande encarregado de nos apresentar os personagens e, apesar de não parecer,
é muito importante como cada personagem se apresenta no início da história.
Logo de cara, é muito fácil ser
conquistado por Mortimer e Meggie. O encadernador é dedicado, gentil e um pai
mais do que admirável. Meggie, por sua vez, é uma garota inteligente, forte e
corajosa. Torna-se praticamente impossível não simpatizar com os protagonistas
da história. E os coadjuvantes também não ficam atrás. Elinor é uma mulher já
velha e loucamente apaixonada por livros. Ela é o que poderíamos chamar de
“rata de biblioteca” ou talvez ela vá mais além. Afinal, Elinor tem uma enorme
coleção de livros e trata cada um deles como seu próprio filho. Fenóglio por
sua vez, é um orgulhoso escritor que gosta muito de criar vilões e histórias
tristes. E por falar nesses vilões, Capricórnio, Basta, Mortola e outros são
mesmo terríveis. Capricórnio nos parece a própria personificação do mal. E o
que dizer de Basta e sua navalha? Quanto sadismo não há escondido naquele
mascador de folhas de hortelã? E Mortola? A gralha velha, mãe de Capricórnio,
mas cujo filho trata apenas como uma governanta? Entretanto, em equilíbrio a
esses vilões terríveis, temos Dedo Empoeirado. Durante todo o primeiro livro
não se sabe muito bem de que lado ele está; talvez, do lado dele mesmo. Agindo
hora de uma forma, hora de outra, o cuspidor de fogo nos confunde e cativa. Não
só ao leitor, mas também ao menino Farid, um garoto que é lido do livro As Mil e Uma Noites e, desde então,
passa a seguir Dedo Empoeirado.
Coração de Tinta é uma ótima forma de
abrir uma trilogia. O livro prende a atenção do leitor fazendo com que este não
consiga desgrudar dele até termina-lo e há um fato muito interessante sobre
ele. De uma certa forma, pensando nos três livros, Coração de Tinta é o único
que soa mais “independente”. Quando você termina de lê-lo, apesar de desejar
uma continuação, é possível pensar que a história acabou ali. E ela podia ter
acabado ali, podia, mas não acabou.
O segundo livro, Sangue de Tinta, já se abre com uma premissa mais sombria do que o primeiro. Se Coração de Tinta era o começo do sonho, Sangue de Tinta serve para mostrar que todo sonho tem duas faces. O livro começa com Dedo Empoeirado sendo, enfim, lido de volta para o seu mundo. Porém, o leitor que faz esse favor, Orfeu, estava aliado com Basta e Mortola. Enquanto isso, Mô, Meggie e Resa (Theresa), estão morando na casa de Elinor. Resa contou a todos como foram seus anos no Mundo de Tinta e Meggie se mostra completamente fascinada pelo local. A garota está quase obcecada e morre de vontade de ver com os próprios olhos os lugares que a mãe descreve. Por conta disso, ela e Mô estão brigando com frequência. No meio disso tudo aparece Farid, que havia sido deixado para trás quando Dedo Empoeirado foi lido novamente para seu mundo, pedindo que Meggie o leia para dentro de Coração de Tinta. A garota vê nisso uma oportunidade de conhecer o lugar que tanto deseja e lê a si própria para dentro do livro. Logo após, Mortola e Basta aparecem na casa de Elinor com Orfeu e voltam para o Mundo de Tinta levando Mô e Resa consigo. Dessa forma, todos vão parar dentro do universo de Coração de Tinta que não é mais exatamente da forma que Fenoglio o escrevera. O mundo parece estar criando vida própria, mas agora com a ajuda de Meggie, Fenoglio têm esperança de colocar as coisas nos eixos. Uma vez no Mundo de Tinta, Meggie percebe que talvez o lugar não seja tão maravilhoso quanto parece nas histórias e se vê diante de personagens como Cosme, o Príncipe negro, Cabeça de Víbora, o Príncipe Porcino e outros, que antes ela só conhecia através da tinta e do papel.
Sangue de Tinta é um livro mais sombrio e denso que Coração de Tinta. A história vai se tornando mais séria e é quando começa a aparecer de forma mais incisiva o questionamento: será que seria mesmo bom poder entrar dentro de um livro? Os personagens começam a se transformar lentamente. Novos personagens são inseridos e um mundo belo e terrível nos é mostrado. O Mundo de Tinta pode ser muito cruel, porém suas fadas e criaturas mágicas compensam seu lado terrível. Ou será que não? Em Sangue de Tinta, Meggie e Mô têm de enfrentar perigos nunca antes imaginados e se adaptar à um mundo completamente diferente que seduz e amedronta. É um livro onde muita coisa acontece. A história dá várias reviravoltas, quase sempre nos surpreendendo. Sangue de Tinta é um livro que contém muita informação, não só pela grande quantidade de criaturas e personagens que são apresentados nele, mas também por conta de todos os fatos que ocorrem. Para completar, o final do livro é caótico deixando o leitor maluco para saber o que irá acontecer no próximo.
O segundo livro, Sangue de Tinta, já se abre com uma premissa mais sombria do que o primeiro. Se Coração de Tinta era o começo do sonho, Sangue de Tinta serve para mostrar que todo sonho tem duas faces. O livro começa com Dedo Empoeirado sendo, enfim, lido de volta para o seu mundo. Porém, o leitor que faz esse favor, Orfeu, estava aliado com Basta e Mortola. Enquanto isso, Mô, Meggie e Resa (Theresa), estão morando na casa de Elinor. Resa contou a todos como foram seus anos no Mundo de Tinta e Meggie se mostra completamente fascinada pelo local. A garota está quase obcecada e morre de vontade de ver com os próprios olhos os lugares que a mãe descreve. Por conta disso, ela e Mô estão brigando com frequência. No meio disso tudo aparece Farid, que havia sido deixado para trás quando Dedo Empoeirado foi lido novamente para seu mundo, pedindo que Meggie o leia para dentro de Coração de Tinta. A garota vê nisso uma oportunidade de conhecer o lugar que tanto deseja e lê a si própria para dentro do livro. Logo após, Mortola e Basta aparecem na casa de Elinor com Orfeu e voltam para o Mundo de Tinta levando Mô e Resa consigo. Dessa forma, todos vão parar dentro do universo de Coração de Tinta que não é mais exatamente da forma que Fenoglio o escrevera. O mundo parece estar criando vida própria, mas agora com a ajuda de Meggie, Fenoglio têm esperança de colocar as coisas nos eixos. Uma vez no Mundo de Tinta, Meggie percebe que talvez o lugar não seja tão maravilhoso quanto parece nas histórias e se vê diante de personagens como Cosme, o Príncipe negro, Cabeça de Víbora, o Príncipe Porcino e outros, que antes ela só conhecia através da tinta e do papel.
Sangue de Tinta é um livro mais sombrio e denso que Coração de Tinta. A história vai se tornando mais séria e é quando começa a aparecer de forma mais incisiva o questionamento: será que seria mesmo bom poder entrar dentro de um livro? Os personagens começam a se transformar lentamente. Novos personagens são inseridos e um mundo belo e terrível nos é mostrado. O Mundo de Tinta pode ser muito cruel, porém suas fadas e criaturas mágicas compensam seu lado terrível. Ou será que não? Em Sangue de Tinta, Meggie e Mô têm de enfrentar perigos nunca antes imaginados e se adaptar à um mundo completamente diferente que seduz e amedronta. É um livro onde muita coisa acontece. A história dá várias reviravoltas, quase sempre nos surpreendendo. Sangue de Tinta é um livro que contém muita informação, não só pela grande quantidade de criaturas e personagens que são apresentados nele, mas também por conta de todos os fatos que ocorrem. Para completar, o final do livro é caótico deixando o leitor maluco para saber o que irá acontecer no próximo.
Morte de Tinta é o terceiro e último
livro da trilogia e o nome é mais do que sugestivo. Esse é o livro mais sombrio
e também mais triste de todos os três. Durante toda a narrativa há uma
melancolia no ar, uma tristeza contínua. É nesse livro também, que a mudança
dos personagens se dá por completa. Eles estão transformados e os que ainda não
estão, em breve serão transformados. Tudo o que cada um deles passou serviu
para marcá-los, despertar neles novos lados antes desconhecidos. Mô, agora não
é só mais um encadernador. Mô agora é o Gaio e tem como tarefa corrigir seu
erro e mandar para o além o, agora imortal, Cabeça de Víbora. Enquanto isso, Orfeu
torce e retorce o Mundo de Tinta como se este o pertencesse, se tornando um dos
personagens mais cruéis de toda a trama. Assim como em seu antecessor, muitas
coisas acontecem nesse livro também, embora talvez com um ritmo mais lento.
Entretanto, apesar de ser, por um lado, mais “parado”, Morte de Tinta não te
deixa respirar da maneira devida. Durante todo o desenrolar da trama o leitor
teme por seus personagens favoritos. Tudo está por um fio, a qualquer momento
muitas coisas podem dar errado. Se antes o Mundo de Tinta já não funcionava da
maneira exata que Fenoglio o imaginara, agora mesmo é que as coisas estão ainda
mais fora de controle. Talvez a resolução do “grande conflito” do livro
aconteça de uma forma meio “rápida”, porém o desenrolar do que veio antes
compensar. Em Morte de Tinta acontecem cenas e experiências lindas e
empolgantes, tudo acompanhado da já citada melancolia.
O final de Morte de Tinta é feliz,
por assim dizer; entretanto, todos os personagens estão marcados. Coisas
aconteceram, muitas coisas. Coisas boas e ruins. Coisas maravilhosas e
terríveis. E isso tudo não pode e nem deve ser ignorado. Ao final de tudo, a
tristeza e tensão que permeia todo o livro se transforma em uma espécie de
nostalgia. Algo que ao mesmo tempo que dá uma pontada, também acalenta o
coração.
Mundo de Tinta é uma trilogia que
podia facilmente ser descrita bela expressão “bela e terrível”, assim como o
universo do livro onde a história se passa. O Mundo de Tinta seduz e assusta,
atrai e afasta, bate e acalenta. Ele te faz pensar o quão bom, verdadeiramente,
seria entrar numa história fictícia. O preço que seria necessário pagar para
que isso acontecesse. Se tudo isso valeria a pena. Ainda assim, é fantástico
pensar em uma narrativa onde os protagonistas são tão apaixonados por livros
quanto o leitor que a lê. Isso te aproxima da história e torna a experiência
ainda mais agradável.
Outro grande mérito da trilogia é que
Cornelia não constrói uma história que segue apenas um personagem. Apesar de Mô
e Meggie serem os protagonistas, em vários momentos o narrador acompanha outros
personagens. Não apenas “mais um”, mas vários. Por vezes o desenrolar da
história se dá através de acontecimentos que ocorrem em dois lugares
diferentes. Algo que faz com que sejamos capazes de acompanhar dois ou mais
linhas de pensamento e encadeamento de acontecimentos de uma mesma história
que, em um determinado momento, vão colidir em um mesmo lugar. Isso sem contar
que as edições são lindas, com ilustrações e citações no começo de cada capítulo.
De toda a trilogia, apenas Coração de
Tinta foi adaptado para o cinema. O filme é consideravelmente fiel ao livro e
os atores combinam, em sua maioria, bastante com os personagens que
interpretam. Assim como o livro, o filme é muito bonito e muito mágico.
Mundo de Tinta é uma trilogia linda,
mágica, maravilhosa, bela e terrível. Ela tem personagens maravilhosos e
personagens possuidores de uma maldade assustadora. Ela tem momentos engraçados
e leves, mas é toda permeada por uma tristeza gigantesca e a sensação de que
ela só vai aumentar e piorar. Ela tem criaturas fantásticas como
Homens-de-Vidro, Elfos de Fogo e Damas Brancas. Ela tem personagens gentis que
precisam se tornar excepcionalmente fortes, como Mô. Ela tem jovens corajosas
como Meggie. Ela tem príncipes, reis, camponeses e saltimbancos. E ela tem
leitores, muito leitores. Porque Mô, Resa, Meggie e Elinor também são leitores.
Eles são leitores como eu e você e é isso que faz com que nos conectemos tão
profundamente com eles. E é isso que torna toda a experiência tão mágica. Mundo
de Tinta é sobre livros, páginas, tintas, bibliotecas, palavras, livros e todo
o amor que leitores nutrem por tudo isso.
“[...]. Bem,
talvez vivam mais, porém apenas respiram quando alguém abre o livro. Elas são
som prensado entre folhas e papel, e somente uma voz as desperta novamente para
a vida! [...]”