“Quando Alice ficar adulta
ela com certeza contará histórias
estranhas
para criancinhas que se parecem com ela.
E, nessas histórias, ela provavelmente
contará aquela...
A história de um mundo fantástico
com o qual sonhou há muito tempo. ”
Alice é, com certeza,
um nome deveras emblemático. Quando esse pequeno conjunto de letras é
pronunciado, muito provavelmente, algo será evocado na memória de quem o ouve.
Não é Alice o nome de uma das heroínas da Disney? Não é Alice o nome daquela
garotinha do livro de Lewis Carrol? Uma menina esperta e muito curiosa que
persegue um coelho atrasado, acabando por cair dentro de sua toca e lá no fundo
descobrir um mundo de maravilhas...
O nome Alice e
todo sentido e relações que ele carrega é frequentemente utilizado, ou reutilizado,
na literatura, no cinema e nas demais mídias. Vários capítulos extras,
episódios especiais e fillers de diversos títulos de mangá e anime já foram
lançados utilizando-se de alguma forma da história de Carrol, seja através de
um crossover ou de uma caricatura.
Um dos animes da
há pouco encerrada temporada de abril, faz mais ou menos a mesma coisa, porém,
talvez dando um passo além. Alice to Zouroku é baseado em um mangá homônimo de
autoria de Tetsuya Imai; a história foi serializada em 2012, no Japão, e
compilada em sete volumes no formato tankôbon. Alice to Zouroku se apropria do
nome “Alice”, como também da ideia e do conceito de “País das Maravilhas”
criando algo novo, ao mesmo tempo que deixa mais do que evidente as referências
e intertextualidades com a obra de Lewis Carrol.
A história começa
com um grupo de garotas que possuem um poder chamado “Sonhos de Alice”,
habilidade que as torna capazes de fazer sua imaginação se tornar realidade.
Essas meninas são tratadas como objeto de pesquisa em um determinado
laboratório. Uma dessas garotas, Sana, cujo poder específico inclui a
habilidade de ignorar as leis da física e manifestar qualquer coisa que ela
seja capaz de imaginar, escapa do laboratório e encontra Zouroku, um velho
levemente ranzinza que não gosta de interrupções em sua vida cotidiana.
Apesar do início
“garotas presas em laboratório → uma delas foge → o laboratório passa a
persegui-la” Alice to Zouroku não se mantém o tempo todo nessa linha. Na
realidade, a história se trata muito mais de acompanhar o cotidiano de Sana
após seu encontro com Zouroku e seu crescimento, do que uma corrida “dos caras
maus” atrás da protagonista.
O primeiro
episódio do anime pode não agradar muito visualmente, já que a animação não é
das melhores e, embora melhore um pouco nos próximos episódios, não sai muito
do médio-regular, entretanto, a história compensa. Alice to Zouroku consegue
reunir numa mesma narrativa uma parte inicial de fuga, batalhas, fortes emoções
e descobertas, e uma parte seguinte de um slice of life cotidiano quase tão
fofo quanto Amaama to Inazuma. No que diz respeito aos personagens, eles são em
sua maioria muito carismáticos, inclusive o rabugento Zouroku.
Comecemos a falar
dos personagens por Sana, a protagonista. Conhecida no laboratório como Rainha
Vermelha, a garotinha é capaz de criar com seu poder absolutamente qualquer
coisa que imaginar. Ela possui entre 8 e 10 anos e sua inocência causada pela
idade e pelo desconhecimento que possuí com relação ao mundo exterior acaba, às
vezes, lhe trazendo problemas. Ao fugir do laboratório encontra-se com Zouroku,
àquele que irá acolhe-la e, ao seu lado, protagonizar cenas de imensa fofura.
Zouroku, por sua
vez, é um velho rabugento dono de uma floricultura. Inicialmente, ele tenta não
se envolver de forma alguma com Sana, mas é incapaz de deixar uma garota tão
jovem abandonada à própria sorte. Apesar de ser um tanto resmungão e ter uma
cara um tanto fechada, Zouroku é um avô muito amoroso tanto para Sana quanto
para sua neta biológica.
Kashimura Sanae é
a neta de Zouroku. Ela mora com o avô desde que seus pais morreram, há muitos
anos atrás. Sanae aceita Sana com muita facilidade em sua casa, feliz por ter
uma espécie de irmã mais nova. A garota demonstra ter um jeitinho um tanto
desligado que acaba sendo um bom escape cômico.
Além de Sana,
existem outras garotas no laboratório, também possuidoras dos “Sonhos de
Alice”. Dentre essas meninas estão Asahi e Yonaga, gêmeas idênticas cujas
habilidades são, respectivamente, materializar qualquer arma conectada à uma
corrente e invocar um arco.
Outro núcleo de
personagens da narrativa são os encarregados do governo ocupados de investigar
sobre os “Sonhos de Alice” e sua coexistência com os demais seres humanos.
Fazem parte desse núcleo Naitô Ryû, um antigo amigo de Zouroku que deseja saber
mais sobre os “Sonhos de Alice”; Yamada Noriko, uma especialista técnica que
trabalha junto com Naitô, admiradora fervorosa de sua veterana; e Ichijo
Shizuku, a assistente de Naitô capaz de invocar 666 armas diferentes.
Não é somente o
carisma dos personagens, porém, que torna Alice to Zouroku uma narrativa
prazerosa de ser acompanhada. No próprio enredo existem algumas sutilezas que
devem ser levadas em consideração. Como, por exemplo, o fato de os “Sonhos de
Alice” serem poderes que materializam e evocam coisas a partir da imaginação de
suas usuárias, em sua maioria garotas muito jovens. Nesse detalhe tão simples,
há uma espécie de valorização da imaginação infantil como uma força poderosa.
Essa ideia é consideravelmente
explorada na narrativa, principalmente no que diz respeito à Sana. A
protagonista é uma criança tão jovem e tão pura quanto a ideia que, de fato, se
faria da Alice de Carrol. Sua curiosidade e inocência, características tão
genuinamente infantis, combinadas com seu poder criam uma protagonista que
desperta simpatia no público e servem para dar um clima leve, um tanto
aconchegante, quase inserindo nostalgia, à trama.
Outro ponto sutil,
mas interessante da narrativa é o próprio “País das Maravilhas”. Ele aparece na
história como um fenômeno sem explicação de onde nasce Sana, um lugar onde tudo
parece ser possível e onde a palavra “maravilhas” pode exercer todos os seus
sentidos amplamente. Não é apenas uma referência, é mais do que isso. Ocorre
uma espécie de ressignificação ou talvez uma acentuação de significado. O País
das Maravilhas tem fome de conhecimento do mundo humano, ele quer aprender tal
qual uma criança curiosa.
Ainda no campo das
sutilezas, vale a pena citar a abertura e o encerramento que combinam
maravilhosamente com a narrativa tanto em temática quanto em clima. São
absurdamente lindos e bem sacados, principalmente, no que diz respeito às
músicas escolhidas.
Alice to Zouroku
não é uma obra prepotente, nem possuí grandes ambições. É uma história
bonitinha, engraçada e leve, com alguns toques de drama e batalhas, nada muito
além disso. Uma narrativa singela e carismática como sua protagonista, que
acaba por explorar, propositalmente ou não, alguns aspectos da criança e da infância.
No anime, ecoa a Alice de Lewis Carrol de uma forma que vai além das
referências e intertextualidades, quase como se uma essência tivesse sido
captada. A essência de Alice, que não é apenas uma, mas várias: as muitas
Alices que por aí existem, crianças curiosas, ingênuas, mas espertas,
imaginativas o suficiente para criarem seu próprio País das Maravilhas, que não
só ouvem como também vivem histórias, aventuras que um dia contarão para outras
crianças tão curiosas, imaginativas e sonhadoras quanto elas.
“Esta
é....
... a história de uma garota....
...que continua procurando a ‘si mesma’,
para que vire seu ‘eu’”.
De repente entro no marcador do seu blog e aparece que ele não existe... Que dor no peito. Hahaha, mas você ainda está aqui, que bom.
ResponderExcluirAssisti os primeiros capítulos desse anime (novamente instigado pela sua resenha) e gostei, o tipo que estava procurando, uma história leve e divertida.
Alice to Zouroku é uma graça, eu gostei bastante. A animação não é a melhor do mundo, principalmente no primeiro episódio, mas acho a história muito divertida e bonitinha.
ExcluirFico feliz que você tenha gostado.