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Resenha: Kiznaiver

“Todos querem esculpir suas próprias cicatrizes em outra pessoa.
Todos querem conectar-se com outra pessoa. ”

As relações que as pessoas travam entre si é algo, sem dúvidas, complicado. Pessoas brigam, se odeiam e se ferem mutuamente; muitas vezes, são incapazes de se compreenderem, se entenderem e se unirem, o que acabar por causar grandes problemas como guerras ou ciclos de ódio que parecem não ter fim. Talvez as coisas melhorassem, talvez o mundo melhorasse, se as pessoas fossem capazes de exercer um pouco de empatia. Se elas fossem capazes de se reconhecerem no outro, de compreenderem as dores e os sentimentos do outro. Mas como fazer isso? E se houvesse um experimento? Um sistema capaz de unir as pessoas? Algo que causasse uma experiência forte o suficiente para fazer com que os indivíduos ficassem ligados e aprendessem a compreender o outro? É esse um dos pontos de partida do anime Kiznaiver. 

Kiznaiver é um anime original produzido pelo estúdio Trigger. A história se passa na fictícia Sugumori, uma cidade futurista construída sobre uma terra recuperada. Agata Katsuhira é um estudante do ensino médio incapaz de sentir dor. Um dia, pouco antes das férias de verão, ele é abordado pela misteriosa Sonozaki Noriko; a garota lhe diz que ele foi selecionado para ser um “kiznaiver”. Kiznaivers são indivíduos que compartilham a dor entre si. Quando um kiznaiver é ferido um sistema divide a dor em partes iguais e a distribuí dentre todos os kiznaivers. Os escolhidos para serem conectados a Katsuhira são alguns de seus colegas, todos com personalidades e interesses completamente diferentes; pessoas que em situações normais nunca se aproximariam. Sonozaki diz que o “sistema kizna” é uma experiência crucial para pôr fim a este mundo de conflitos e alcançar a paz. A partir daí os selecionados são obrigados a passar por duras provações para alcançar esse objetivo.

Kiznaiver é um anime curioso em vários aspectos, ou melhor, ele chama a atenção por vários aspectos. O primeiro deles é o próprio enredo: Um projeto que tem como objetivo pôr fim aos conflitos e alcançar a paz mundial, cujo meio utilizado para tal é um sistema que liga as pessoas e as conecta através da dor. O quão benéfico isso pode ser? Quais problemas isso pode vir a acarretar? O quão longe essa experiência pode ir?

A emoção escolhida para ser compartilhada não é outra se não a dor. Os kiznaivers são capazes de sentir a dor uns dos outros. Uma vez que sintam as dores uns dos outros eles serão capazes de compreender essa dor, de saber como e onde, exatamente, está doendo. E ao compartilhar e compreender a dor física, seria possível que começassem a se entender para além disso? Seriam os kiznaivers capazes de se compreenderem verdadeiramente? Seriam capazes de se ligarem de uma forma mais profunda até se conectarem para sempre?

As questões levantadas são muitas e, durante todo o anime, você vê essas questões se desenvolverem. A forma como o sistema kizna age, como ele foi descoberto e todo esse embasamento mais científico acaba ficando um pouco mais de lado porque o que importa de verdade é a forma como os kiznaivers se relacionam. Como ser um kiznaiver e conviver com pessoas tão diferentes afeta a vida de cada um deles. Ao sentirem na própria pele as dores uns dos outros, os kiznaivers vão, lentamente, se compreendendo melhor. Apesar de todos os contras, de todas as brigas, pessoas que em situações normais nunca nem se olhariam começam a desenvolver empatia um pelo outro. Cada vez eles ficam mais ligados, conectados para além do sistema kizna.

Kiznaiver é uma narrativa que mexe muito com as emoções dos personagens e, ao mexer com as emoções destes, acaba por mexer com as emoções do expectador. Existem cenas muito tocantes. É dramático, é intenso, é doloso. E quanto mais você se apega aos personagens mais intensas e dolorosas as coisas vão ficando. Conforme a história vai avançando, a dor vai deixando de ser somente física e vai avançando outros patamares. Cada episódio é mais forte e mais dramático que o outro, ao mesmo tempo que há sempre algumas cenas engraçadas para que a narrativa não se torne deprimente. Kiznaiver é deliciosamente intenso. 


Outro ponto que chama a atenção no anime é o design dos personagens. O traço, as cores dos cabelos, até mesmo as roupas, tudo é meio maluco, no melhor sentido da palavra. A forma que os personagens se apresentam visualmente causa um certo estranhamento, o que os tornam tão curiosos quanto o próprio enredo. É malucamente bonito.

Os personagens, porém, não chamam a atenção somente pela forma estética; as personalidades de cada um deles contribuem bastante para isso. Todos são, absolutamente, diferentes uns dos outros. E mesmo que marcados pelo passado, as marcas são diferentes e a forma como eles reagem a elas também. Cada kiznaiver é único.

Comecemos pelo protagonista, Agata Katsuhira. Ele é incapaz de sentir dor, mas não só isso. Katsuhira também não é bom expressar seus sentimentos, não importando de quais natureza sejam. Ele é apático, como se nada o afetasse. Em seu olhar não há medo, não há dor, é como se não houvesse nada. Entretanto, ele sente as coisas, embora não consiga expressá-las de nenhuma forma. É através de seu contato com os demais kiznaivers que Katsuhira começa a compreender melhor suas próprias emoções e procurar meios de demonstrá-las.

Temos então, Takashiro Chidori, a amiga de infância de Katsuhira. Chidori é bastante emocional e um pouco intrometida. Ela conhece Katsuhira há muito tempo e se lembra de quando ele era uma criança animada e engraçada; Chidori quer trazer o “antigo eu” de seu amigo de volta, livrando-o da apatia que parece consumi-lo atualmente.

Outro escolhido para o sistema kizna é Tenga Hajime, um delinquente impulsivo e agitado, chegando até mesmo a ser desagradável. Porém, por baixo de todo esse jeitão de mau, Tenga se preocupa muito com seus amigos e está sempre pronto para ajudar. Ele tem um jeito meio maluco e engraçado que o torna, de longe, um dos personagens mais carismáticos.

Apesar de Tenga ter esse jeitão meio maluco, a verdadeira excêntrica do grupo é Niiyama Niko. A garota é toda cheia de energia, um poço de animação, que alega ser capaz de ver fadas. Niko se veste de um jeito muito colorido, toda a sua aparência é ainda mais colorida do que a dos demais personagens. A aparência dela chega a lembrar uma bonequinha de pano. Entretanto, apesar da intensa animação e da fofura excessiva, Niko tem um lado consideravelmente maduro e perspicaz. Toda essa personalidade excêntrica dela a torna, ainda, tão engraçada quanto o próprio Tenga.

O quinto kiznaiver é Yuta Tsugihito. Yuta é um estudante astuto, centrado e muito popular com as garotas. Ele se preocupa bastante com sua aparência e tenta se envolver o menos possível com os outros kiznaiver, com exceção de Honoka, a única de quem ele verdadeiramente se aproxima.


Maki Honoka é uma garota inteligente e distante que mantém uma atitude fria e condescendente com as outras pessoas. Tem um passado complicado e triste, o que faz com que ela seja um pouco amarga e não queira se aproximar muito das outras pessoas. Honoka é a que menos aceita a ideia dos kiznaivers tornaram-se amigos.

O último membro dos kiznaivers é Hisomu Yoshiharu, um garoto bonito e um tanto misterioso. Hisomu é um masoquista, portanto, está mais do que satisfeito com a possibilidade de sentir a dor física de seus companheiros. Apesar disso, ele não é potencialmente perigoso e passa a maior parte do tempo sorrindo. Hisomu é também absurdamente franco, muitas vezes irritando os demais kiznaivers. Ele nunca vai às aulas e nunca tinha sido visto por seus companheiros até todos serem selecionados como kiznaivers.

A responsável por apresentar o projeto kiznaiver para Ktsuhira e os outros é Sonozaki Noriko, uma garota muito bonita que não demonstra emoção alguma. Ela está determinada a levar o sistema kizna adiante e faze-lo dar certo, não se importando, muitas vezes, com o que terá de fazer para atingir o objetivo.
Além da personalidade e do design dos personagens, e da história em si, outro ponto atrativo em Kiznaiver é a trilha sonora. A abertura de Kiznaiver é, para todos os defeitos, linda. A música, as cores, as formas... Tudo se encaixa perfeitamente. É uma grande mistura de cores e sons quase entorpecente. É muito bonito e te conquista nos primeiros segundos. O encerramento não é tão empolgante, mas é bem feito e conversa bastante com o anime no geral. A animação não foi impecável, houveram alguns deslizes até que visíveis, mas o enredo e a aparência dos personagens compensam essa parte.

Kiznaiver foi, de longe, um dos animes mais emocionantes da temporada passada. Emocionante no sentido exato da palavra, não só empolgante. Foi reflexivo, forte, intenso e dramático, capaz de levantar a questão: como seriam as coisas se as pessoas conseguissem se conectarem e se compreenderem genuinamente? Kiznaiver foi, em todas as instâncias, lindo.

“É porque não entendemos, apenas supomos o que o outro pensa.
E ficamos tentando capturar o significado de cada palavra...
Você acaba pensando tanto na pessoa, e se aproximar deles acaba se tornando
algo doloroso, assim você acaba se distanciando...
Ao fazer isso, sempre e sempre, você acaba se tornando amigo. ”






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