Vez por outra nos deparamos com um livro que, logo no primeiro olhar,
nos enche de curiosidade; esse é o caso de O Gigante Enterrado. Seja pela capa
que é fantasticamente linda, capaz de captar vários dos seus sentidos, seja
pelo inusitado fato de ser uma literatura britânica escrita por um japonês.
De autoria de Kazuo Ishiguru, O Gigante Enterrado se passa numa terra
marcada por guerras recentes e sob uma névoa do esquecimento. A história se
inicia com um casal de idosos que resolve visitar o filho que há muito não
viam, porém, sua jornada acaba se tornando mais longa e cheia de desvios do que
eles esperavam. O livro transita entre a fantasia e o lirismo e trata com muita
delicadeza de temas como o amor, a guerra e a memória.
Devo dizer, logo de início, que o livro tem um clima tolkiano muito
grande. Durante a leitura, muitas vezes eu me sentia imersa num universo
semelhante ao de O Senhor dos Anéis e não estou dizendo isso pela temática do
livro. Tem alguma coisa no estilo do Ishiguro que me lembra o estilo do Tolkien
em A Sociedade do Anel; ironicamente, o Pullman da trilogia Fronteiras do
Universo, me remete ao mesmo sentimento em determinados momentos. É como um
peso leve, um avanço lento, é acolhedor. Eu gosto.
O Gigante Enterrado foi uma descoberta interessante. Quando li o título
não imaginei que a história seria contada da maneira que é contada, ou seguiria
os rumos que seguiu. Foi uma surpresa satisfatória. O narrador começa o livro
se dirigindo ao leitor e, apesar de muita gente reclamar disso, esse é um dos
recursos literários que mais me agradam. Eu gosto que falem comigo; dá a
impressão de que aquela história, aqueles acontecimentos, são verídicos. Como
no livro tudo se passa num período anterior à formação da Inglaterra como
Inglaterra propriamente dita, tudo casa muito bem.
Durante o desenrolar da história, são inseridos outros personagens na
trama além do nosso já conhecido casal do primeiro capítulo. Permeando o livro
todo, ou boa parte do livro, temos dois cavaleiros e um menino. Têm-se também
muitos aldeões e viajantes, mas eles estão apenas de passagem. Enfim, um desses
cavaleiros é um cavaleiro arturiano o que faz com que o próprio Artur seja
citado na história. O que acontece, então, é uma narrativa onde se reverbera os
tempos do Rei Artur! Eles discorrem, questionam e conversam sobre a Bretanha
antes, durante e depois do rei capaz de unir as duas cruzes. Como tenho um
pequeno tombo por histórias arturianas essas partes da história me agradaram bastante.
Por ser um livro que trata de uma viagem, uma jornada, literalmente,
houve momentos em que o ritmo ficou um pouquinho enfadonho. Mas o final
compensa bastante. Conforme todas as peças vão se encaixando, a narrativa se
mostra mais e mais interessante. As cenas de batalha são rápidas, mas acredito
que o foco da história é muito mais todo o plano de fundo às batalhas do que as
lutas em si. A narrativa trabalha com o amor e a memória, e eles são chave
muito importante para se compreender tudo o que acontece.
O final me deu aquele sentimento de dualidade. Foi bom porque foi
bonito, lindo, poético. Mas foi ruim porque eu não queria que tivesse acabado
daquela forma. Quando eu fui percebendo que ia mesmo terminar daquele jeito foi
dando um desespero..., Mas, como já disse, foi um desfecho bem bonito. Uma
outra coisa interessante é que, pensando agora, o jeito como tudo se inicia e
depois como tudo termina, dá a impressão de que a narrativa toda não passou de
apenas um pedaço da história de algo muito maior. Talvez daquela terra, talvez
da Bretanha toda, talvez do próprio mundo.
Num geral, foi uma experiência agradável. Teve fantasia, dragões, ogros,
cavaleiros, viagens e batalhas. Teve poesia, flashback e conversas memoráveis.
Teve reflexões e momentos de tirar o fôlego e apertar o coração. E você passa o
livro todo tentando entender porque a história se chama O Gigante Enterrado. E,
na hora que você descobre, do jeito que você descobre, é tão simples que chega
a ser cômico. Para quem gosta de livros com esse clima fantástico antigo é uma
boa pedida. O Gigante Enterrado é uma história fantástica e linda que, ao fim
de tudo, deixa aquele gostinho de "quero mais".
Nenhum comentário:
Postar um comentário